As
histórias ou argumento de peças de teatro
têm, naturalmente, a sua origem em histórias
ou argumentos de vida; por isso, não será
descabido que se considerem as conexões e similitudes
que ambos apresentam.
Eric Berne
Uma
Ciência da Acção
começa com dois verbos, ser e criar
e três substantivos, actor, espontâneidade
e criatividade.
Jacob-Levy
Moreno
Eric
Berne começou por investigar e teorizar as características
das relações que duas ou mais pessoas
estabelecem entre si, no universo das relações
interpessoais: a identificação dos Estados
do Eu intervenientes numa Transacção (comunicação).
Daí o nome que deu à sua teoria da personalidade:
Análise Transaccional. Mas, Eric Berne não
se coibiu de dizer o que muitos transaccionalistas parecem
ter esquecido: O verdadeiro conhecimento consiste
em, mais do que aprender conceitos, aprender a modificar
comportamentos na acção concreta, sabendo
como reagir (Berne, 1949). Nesta óptica,
a identificação dos Estados do Eu, a análise
de Jogos Psicológicos e dos Cenários de
Vida, não são mais do que uma base para
a mudança, que só será possível
se for fundamentada na capacidade de dar respostas autónomas
e específicas aos estímulos emitidos pelos
outros aqui e agora, nas várias interacções
quotidianas. E, a nosso ver, esse objectivo só
será atingido se forem utilizados instrumentos
e metodologias que privilegiem o trabalho em grupo,
o jogo de papéis, as técnicas de expressão
corporal, entre muitos outros meios para o desenvolvimento
pessoal. Mas, nem Berne nem os seus seguidores definiram
metodologias ou instrumentos que permitissem, no terreno
da psicoterapia ou da formação, indicar
como podem as pessoas reagir a estímulos transaccionais
inapropriados ou insatisfatórios, analisarem
os Jogos Psicológicos em que se envolvem e procederem
à modificação do seu Cenário
de Vida. Nesta óptica, a identificação
dos Estados do Eu, a análise das Transacções,
dos Jogos Psicológicos e dos Cenários
de Vida, não são mais do que uma base
para a mudança, que só será possível
se fundamentada na capacidade de dar respostas autónomas
e específicas aos estímulos emitidos pelos
outros aqui e agora, nas várias interacções
quotidianas. E, a nosso ver, esse objectivo só
será atingido se forem utilizados instrumentos
e metodologias que privilegiem o trabalho em grupo,
o jogo de papéis, as técnicas de expressão
corporal, entre muitos outros meios para o desenvolvimento
pessoal. Mas, nem Berne nem os seus seguidores definiram
metodologias ou instrumentos que permitissem, no terreno
da psicoterapia ou da formação, indicar
como podem as pessoas reagir a estímulos transaccionais
inapropriados ou insatisfatórios, analisarem
os Jogos Psicológicos em que se envolvem e procederem
à modificação do seu Cenário
de Vida.
O
diagnóstico em Análise Transaccional,
tal como o concebeu Eric Berne visa determinar o ponto
concreto de partida para o trabalho pessoal, o domínio
da linguagem a utilizar posteriormente e a definição
de indicadores para a celebração de um
contrato psicológico. Ora o que temos podido
verificar é que, na maior parte das abordagens
que conhecemos, o diagnóstico representa, por
um lado, uma forma de etiquetagem e, por outro, um fim
em si mesmo, aspectos que Berne repudiava veementemente,
mas que parecem encantar muitos transaccionalistas,
que confundem o meio com o fim. Para que o diagnóstico,
feito através dos dados recolhidos nos testes,
nas observações intuitivas e no contrato
psicológico, não caiam na ratoeira da
etiquetagem ou se tornem palavras mortas deitadas num
divã, há que passar ao acto de mudança,
através de meios adequados: passar da Análise
Transaccional à Acção Transaccional.
Ao
veicular a ideia de que a prática terapêutica
ou formativa se deve centrar na mudança pessoal
por intermédio de acções concretas,
a Análise Transaccional deveria, a nosso ver,
chamar-se Acção Transaccional. De resto,
inúmeros transaccionalistas, ainda que timidamente,
têm seguido este caminho, pois que, na sua prática,
para além de importarem abordagens da Psicologia
Gestalt tentam, na medida do possível, conduzir
a descrição que a pessoa faz do passado
para a cena falada ou jogada no presente, aqui e
agora, pedindo ao participante nas suas terapias
ou acções de formação que
faça o papel de cada pessoa envolvida na cena
(Goulding e Goulding, 1978, p.67). Ora esta é
a base do Psicodrama de Moreno: trazer para o momento
presente o conflito e as personagens que nele intervêm,
através da representação simbólica.
Acreditamos
que o estudo e a mudança de comportamento podem
ser ensaiados em laboratório, como um parêntesis
à realidade, distanciando-se dela ou mesmo ultrapassando-a,
aprendendo-se com a experiência ou até
criando a experiência. É o locus nascendi
do mundo potencial, que só tem sentido fora do
que já foi criado (Moreno, 1944, p.64).
E, neste contexto, O parêntesis pode, pois, ultrapassar
a sua função acessória para se
transformar no objecto principal. Neste parêntesis
de acção e de observação
da acção, cada participante percepciona
aquilo que é, descobre aquilo que não
é e imagina aquilo que é possível
vir a ser. Percepciona onde se encontra e onde não
está e imagina onde é possível
chegar (Boal, 1990, p.21).
Partindo
do princípio de que a pessoa aprende tanto melhor
quanto mais os vários aspectos que compõem
o seu ser, intelectual, emocional, físico e espiritual,
coexistem numa mesma actividade, Claude Steiner, um
dos mais importantes teóricos da Análise
Transaccional, defende o jogo de papéis, considerando
que esta técnica originária do Psicodrama
e adaptada mais tarde pela Terapia Gestalt, é
uma demonstração bastante convincente
da realidade dos Estados do Eu (1984, p.55). No
entanto, incompreensivelmente, tem o jogo de papéis
sido pouco ou nada valorizado e integrado em práticas
de Análise Transaccional, o que levou Fritz Perls,
que sempre se impressionou positivamente com o trabalho
de Eric Berne e a ênfase que o pai da Análise
Transaccional colocou no jogo de papéis, a mostrar
a sua decepção: a ideia de maturação,
de integração e de transcendência
do jogo de papéis parecia ser-lhes estranha (Perls,
1969, p. 264). Era e é-lhes estranha. E, no entanto,
como refere Leutz (1985), Eric Berne sempre deu
aos jogos interaccionais um lugar de destaque na Análise
Transaccional.
Porque, na nossa prática psicopedagógica,
como transaccionalista, tivemos esta mesma sensação
de falta de instrumentos práticos de intervenção,
mais do que ter adoptado o termo Acção
Transaccional, procuramos criar uma metodologia que
visa a transformação e evolução
pessoais num espaço simultaneamente transaccional
(relacional) e transicional (simbólico) assente
no jogo de papéis, no jogo dramático,
nas práticas psicodramáticas e sociodramáticas,
nas suas múltiplas aplicações e
variantes, a par de alguns princípios importados
da Psicologia Gestalt, da Programação
Neurolinguística e da Sugestologia.
Pode, à primeira vista, parecer pouco ortodoxo
reunir simultaneamente e num mesmo espaço-tempo,
a abordagem Psico e Sociodramática, a Terapia
Gestalt, a Sugestopedia, a Programação
Neurolinguística e a Análise Transaccional.
No entanto, temos podido constatar que as várias
estratégias e actividades que propomos nesses
domínios, com particular relevância para
os vários jogos de papéis de incidência
dramática, psicodramática ou sociodramática,
não adulteram a Análise Transaccional,
antes a valorizam e completam, tanto a nível
conceptual como no plano prático e experimental.
O Jogo de Papéis, a par da Psicologia Gestalt,
da Programação Neurolinguística
e da Sugestologia, constitui um factor de inovação
na abordagem da Análise Transaccional, compensando
a sua excessiva racionalidade analítica e a ausência
de instrumentos práticos.
Não
raras vezes temos podido constatar nas diversas acções
de formação que desenvolvemos, nos âmbitos
da formação de professores, da educação
de jovens, da Psicoterapia de Grupo, a forma muito rápida
como os participantes, se apercebem de alguns comportamentos
e formas de estar que os surpreendem e que deles não
têm consciência. O professor que se julga
democrático e não-directivo quando lhe
pedem para criar instantaneamente uma imagem da relação
professor/aluno, espeta o dedo, denunciando o seu autoritarismo
intrínseco, mobilizando, para o efeito o seu
Estado do Eu Pai Autoritário. Reenviado para
a vida real e tendo trazido ao consciente o que estava
inconsciente altera o seu comportamento. O mesmo se
passa, quando se pede, em situação idêntica,
a produção de uma imagem da relação
Pai/Filho.
É no calor do jogo dramático espontâneo
e na rapidez com que se realiza cada acção
que se revela o que escondido está no inconsciente.
É esta a força do jogo de papéis:
substitui mil palavras, permite-nos poupar muito tempo
e aponta para uma conscientização rápida.
Tudo quanto, afinal, Berne preconizava.
Um Laboratório de Acção Transaccional,
sejam quais forem os seus conteúdos programáticos,
desenvolve permanentemente duas capacidades principais:
a capacidade de se questionar, de questionar os outros
e o mundo e a capacidade relacional. Estas capacidades
desenvolvem-se na e pela experimentação
simbólica e lúdica: quando o consciente
joga, o inconsciente trabalha. É este trabalho
do inconsciente que, tanto no jogo como no sonho, confere,
ao comportamento, o sentido e o conteúdo.
(Henriot, 1969, p.26). É, neste contexto, que
os participantes podem aprender a olhar-se e a examinar
as suas próprias realidades, segundo formas que
se produzem raramente no estado natural, dito real,
muscular a percepção, concentrar a atenção
e afinar os sentidos.
O
jogo de papéis que propomos e as várias
formas de retroacção sugeridas, fazem
com que os conceitos transaccionais sejam interiorizados
pela totalidade do Ser, sem barreiras artificiais de
percepção sensorial. Com efeito, o jogo
de papéis, realizado num espaço simbólico,
permite, hic et nunc, a percepção
das formas de pensar e de agir, a integração
dos fenómenos vivenciados e analisados e a transcendência
purificadora provocada pela catársis. As actividades
que propomos situam-se num campo experimental de pesquisa
e visam a interligação da abordagem de
autoconhecimento proposta pela Análise Transaccional
e do Jogo de Papéis na Expressão Dramática,
no Psicodrama ou no Sociodrama, conjugando os princípios
criados por Eric Berne e as virtualidades dos jogos
de papéis. Neste contexto, os jogos de papéis
realçam, confirmam, sublinham e ilustram a realidade
dos Estados do Eu, as Transacções, os
Jogos Psicológicos e os Cenários de Vida,
em Análise Transaccional.
Referências
Bibliográficas
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Schuster.
BERNE, Eric (1949). Psychiatric Quarterly. XXIII, 1949:
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GOULDING, Robert & GOULDING Mary McClure (1978).
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PERLS,
Frederick (1969). Ma Gestalt-thérapie: une poubelle
vue du dehors et du dedans. Paris: Tchou.
©
Luís
Aguilar